sexta-feira, 17 de abril de 2009

O paradoxo de ser Mestre em Artes Marciais

Hoje, tenho mais de quarenta e cinco anos de idade. Mais da metade desse tempo, busquei um mestre em Artes Marciais. Alguém que me ensinasse o Caminho do Guerreiro. No entanto, ao trilhar esta senda não encontrei, de acordo com meu julgamento, pessoa que tivesse uma real maestria. Embora tenha aprendido algo com estes mestres, não me senti motivado a continuar seguindo essas pessoas. Até tentei, mas a visão que eu tinha de um mestre e meu espirito insaciável de busca , não permitiu.

O mundo mudou, se globalizou. Temos muitos elementos disponíveis para fazer comparações. O que pode ser uma benção ou maldição.

Nos tempos antigos, há pelo menos dois séculos atrás, não existia a possibilidade de se ter acesso as informações que temos hoje. De maneira tão explicita e facil. Se o buscador tinha a sorte de encontrar um mestre e ser aceito pelo mesmo, o buscador poderia, quem sabe, trilhar o Caminho do Guerreiro. Mas como não havia parâmetros para comparação, o individuo terminava por aceitar aquilo que tinha encontrado, como ideal.

Quando alguém como eu, busca trilhar esse caminho, se depara nos dias de hoje, com uma infinidade de ofertas. São muitas as escolas e mestres. Mas o problema é quando resolvemos escolher um em especial, para seguirmos o resto de nossas vidas. Se compararmos os mestres de hoje com os mestres do passado, vem a frustração. Embora eu pense que a tendência ao exagero das qualidades dos mestres do passado, seja inevitável.

Mas é visível o fato de que as performances dos mestres de hoje, em grande maioria é questionável. Infelizmente até no extremo oriente isso é visível. Os problemas econômicos que assolam o mundo é no meu ponto de vista, o principal fator para isso. Vemos que a maioria dos mestres orientais que migraram para o ocidente, buscando uma vida melhor, podem nem ser mestres em sua terra natal. E como o ocidental desconhece aquilo que o mestre ensina, tende a aceitar sua palavra e o fato de ter vindo do país onde aquele conhecimento foi descoberto. Imagine um capoeirista indo para a Suiça. Lá ele será tido como mestre em Capoeira facilmente. Quem poderá questionar? Não há parâmetros!

Atualmente quem são os Grandes Mestres? Quando procurei diversas escolas para trilhar o “caminho”, vi muito pouco do que alardeavam os mestres. Mesmo sem ter um alto padrão para comparar, vi falhas inquestionáveis. Em teoria é tudo muito bonito. Mas na prática, não vi o mestre provar que o que ele ensinava, ele dominava. Quero dizer que não vi muita maestria nesses longos anos. Somente encontrei pessoas querendo meu rico dinheirinho. Não que eu ache errado cobrar para dar aulas. Afinal, se a pessoa só faz isso na vida, precisa de dinheiro para sobreviver. Mas eu gostaria de pagar por algo real e não teorias infindáveis, que nunca se comprovam na prática.

Presenciei vários exemplos disso que escrevo. Encontrei mestres que diziam ser seu estilo eficiente em combate por exemplo. Mas eu nunca vi isso na prática. Não seria melhor, dizer: meu estilo é bom como ginástica para saúde. O lado marcial é só para manter uma tradição , etc. Mas o que vi foi o mestre batendo em iniciantes mais fracos para provar a eficácia de sua arte marcial. Houve também, mestres que afirmaram dominar conhecimentos superiores. Mas o que vi, foram pessoas cheias de neuroses (dignos de uma terapia), incapazes de conduzir suas próprias vidas. E quanto a filosofia das artes marciais? Presenciei afirmações de dominio da sabedoria oriental. Que no final se revelou apenas um conhecimento teórico de conceitos. Ou seja, nada prático. Sem aplicabilidade no cotidiano. Sem falar em coisa do tipo: faça o que eu digo e não faça o que eu faço.

A lista vai além, mas é por demais extensa. Então cheguei a seguinte conclusão: que o mestre que procurava, não existia. Ao menos no mundo onde eu vivia. Quem sabe, talvez, se eu dominasse outros idiomas e saisse do Brasil, poderia encontrar um mestre que me satisfizesse? Mas eu cansei de buscar isso. O bom senso me diz que um Bodhidharma, um Morihei Ueshiba, um Bruce Lee, são um em um milhão. Hoje, não almejo encontrar um mestre em particular. Agora eu almejo ser o mestre. Pois cheguei a conclusão de que o “mestre” sempre esteve comigo, em meu interior.

Quando o discípulo está preparado o mestre aparece. É o que diz o velho provérbio. Creio que isso seja verdadeiro. Mas descobri também que nem sempre será um mestre de carne e osso. Na verdade, vejo hoje a figura do mestre, como um arquétipo. O mestre está dentro de mim, nas lições do dia dia, em alguém. É uma figura mutável.

Tais conclusões partem da percepção de que quando se tem um alto padrão, na busca do caminho, torna-se mais dificil se satisfazer com qualquer instrumento para se alcançar esse caminho. Para mim, é inviável hoje, seguir alguém cegamente. Estou empenhado em aprender tudo o que a vida tem para me ensinar. Já não me importa se o mestre tem total maestria. Aprendi a filtrar o que chega a mim. Venho tentando então, captar tudo o que é util para meu propósito de vida. Descobri que o que sempre busquei está em diferentes vias de acesso do caminho. Assim, é inevitável que neste processo eu me veja naturalmente trilhando um caminho próprio.

Posso dizer que hoje, trilho meu próprio Caminho do Guerreiro. Não que eu tenha resolvido repentinamente criar meu próprio estilo, sistema, método, etc. Simplesmente me dei conta de que já estava fazendo isso sem o perceber. Eu sou o mestre e o discipulo num só.

Agora minha meta é evoluir cada vez mais. Não importa se o conhecimento vem de A ou de B. Se é tradicional ou moderno. Se é oriental ou não. O que importa é que funcione para mim. Que me ajude a encontrar minhas respostas. Olhando para trás, vejo que mesmo os mestres sem maestria me ajudaram muito. Então, hoje estou mais aberto a aprender com todos.

Na atualidade, no Brasil (e no mundo), vemos pessoas defendendo ferrenhamente, mestres e organizações. O que poderia ser uma saudável fidelidade, torna-se pelo extremismo, algo de hostilidade pelo próximo. Muitas vezes os praticantes de de uma determinada Arte Marcial, termina por fazer aquilo que condenam no outro. E por que esse paradoxo? Infelizmente por dinheiro, fama e fortuna. Status, em detrimento ao Caminho do Guerreiro.

Ninguém quer admitir, que na verdade todos nós somos aprendizes nessa vida. Inclusive os mestres. Penso que temos de entender que Arte Marcial não é religião, no sentido popular desse termo. Arte Marcial é um caminho como tantos outros. E as artes marciais foram criadas por homens, para os homens melhorarem a si mesmos. É um instrumento do homem. O ser humano é mais importante que qualquer caminho.

Esse é meu espirito. Não busco seguir um mestre ou um estilo, mas o caminho do Guereiro. É como preconiza o Zen budismo: usar sem usar, fazer sem fazer. Viver sem apego. Então, por exemplo, se desejo estudar um determinado estilo, não significa que estou excluindo tudo o que conheço de outros caminhos. Para mim, muitos outros são excelentes. Cada um dentro de sua peculiaridade e propósito. Isso me parece o obvio.

Penso também, que posso ser um mestre e ainda assim aprender com outros mestres. Com tudo isso que escrevo aqui, quero dizer que me considero um buscador sem preconceitos. Aprendo com todos. Não quero provar nada com estas linhas. Não estou afirmando ser melhor que ninguém (longe de mim tal pretenção). Só quero que saibam de minhas reais motivações. Não me impressionam titulos, graus seja o que for desse gênero. Busco sim, conhecimento útil para a vida. E se alguém deseja que eu compartilhe meus conhecimentos, também estou disposto a isso. Mas eu não ensino uma Arte Marcial, e sim, o Caminho do Guerreiro. Para mim, está claro, que nos dias de hoje já não há como se estabelecer padrões rígidos. Isso é chinês, isso é japonês, isso é brasileiro. A não ser, que a arte esteja sendo praticada em seu país de origem, por seu fundador, a patricios seus, baseada em cultura local.

Para mim, não existe arte marcial pura, autêntica, verdadeira, única, original, etc. Não nesse mundo globalizado. Existe sim, diversos ângulos de visão. Uns mais eficientes, outros menos. Bons praticantes e maus praticantes. Não há como afirmar qual seria o melhor. Para mim, o melhor é o que funciona comigo.

Como um legitimo guerreiro dos tempos modernos, minha luta agora é interior. Eu não almejo a guerra contra o próximo. Eu sou a favor da paz. Mas se a guerra for inevitável, estou pronto.